A ACADEMIA E O QUARTO DO ESTUDANTE: UMA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA?

Resumo: Este artigo tem como objetivo refletir sobre o trabalho do professor na perspectiva da experiência estética enquanto práxis pedagógica, considerando a proposta para o ensino das disciplinas de Artes no curso de Pedagogia. Fez-se um estudo bibliográfico e dos documentos oficiais que legislam sobre a educação nacional, que tratam da formação dos professores e do seu campo de atuação na educação básica. Se a experiência é o que nos toca, nos acontece, há um grande desafio ao professor na formação estética do pedagogo ao considerar a necessária relação entre o saber acadêmico e o quarto do estudante. O professor ironista é aquele que busca conhecer ao praticar a dúvida e a descrença, sem a pretensão de chegar à verdade.

Palavras-chave: Artes; Experiência Estética; Professor Ironista.


INICIANDO...

O ensino das artes na educação vem provocando amplas discussões e reflexões nos diversos os níveis de ensino, e também em outras instâncias, como nas administrativas e políticas. Em virtude desse envolvimento e proposituras, desencadeiam-se ações que provocam e instigam melhorias na qualidade que o campo da educação artística tanto necessita.

O desenvolvimento dessas ações está relacionado, dialeticamente, à formação do professor, logo essas ações estão e estarão sujeitas a alcançar um bom resultado ou não. Visto que os professores nem sempre estão preparados para atuar numa sociedade da aleatoriedade e da mobilidade e nem sempre conhecem a realidade na qual irão atuar.

Pensar sobre a formação do professor na perspectiva do professor ironista, proposta por Imanol Aguirre (2009), deu-se a partir das provocações imanadas no decorrer das discussões realizadas na disciplina de doutorado “História do ensino de arte no Brasil: do modernismo à contemporaneidade”, ministrada pela professora Dra. Rejane Galvão Coutinho.

Para tanto, o objetivo deste texto está em considerar a proposta pedagógica para o ensino das disciplinas de Artes no curso de Pedagogia, e refletir sobre a forma de enfatizar este conhecimento e experienciá-lo com os acadêmicos em formação, a partir, principalmente, das propostas pedagógicas de Imanol Aguirre (2009), Jorge Larrosa (2015) e John Dewey (1980). Fez-se também, uma pesquisa documental a respeito do que estabelecem os documentos oficiais que tratam da obrigatoriedade do ensino de Artes no curso de Pedagogia para a formação do pedagogo.

Escrever sobre a experiência a partir de reflexões teóricas é um desafio importante para o educador na medida em que nos reportamos à prática sem irmos até ela. “[...] uma experiência de pensamento tem sua qualidade estética própria.” já dizia Dewey (1980, p. 91).

Se “experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca [...]”, como sugere Jorge Larrosa (2015, p. 18), talvez escrever sobre, seja semelhante e do mesmo modo interessante, ao se propor a contribuir com as reflexões da formação estética do pedagogo.

Neste sentido, o autor nos convida a experimentar um grande desafio:

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A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um toque de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (LARROSA, 2002, p. 24).

Compreende-se que cabe ao professor especializado em artes ou não e ao estudante se permitir viver essa experiência da qual fala o autor. Pois, o aprender também se faz e se dá na participação dos sentidos para a constituição dos conhecimentos. 

DA LEGALIDADE AOS DESAFIOS DO PEDAGOGO A PARTIR DA PROPOSTA CURRICULAR

A Lei de Diretrizes a Bases da Educação (LDB nº 9.394/96) estabelece a obrigatoriedade do ensino de arte. Em seu Art. 2º, alterado em 13/07/2010, diz: “O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais, constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.” Desde então, esta disciplina tem conquistado espaço no interior da escola, porém nem sempre encontra estrutura material e profissional necessária para sua concretização exitosa.

O Conselho Nacional de Educação em sua Resolução nº. 1, de 15 de maio de 2006, institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Tem-se assim, a partir destes documentos, intensificada a interferência do Estado no ensino e no que concerne a organização curricular dos cursos, e no que diz respeito a obrigatoriedade das disciplinas de Artes.

Art. 5º O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a: “VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano”. (CNE, 2006, p.1). Compreende-se que essa nova perspectiva representa mais uma responsabilidade aos egressos do curso de Pedagogia, somado as atribuições já inerentes à formação do pedagogo.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) estabelecem as normas do que se espera na organização das propostas pedagógicas da educação infantil. Dentre os princípios que norteiam este documento para as propostas pedagógicas das escolas, deve estar presente o princípio Estético “da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais.” (DCNEI, 2010, p. 16).

O Documento, quando trata dos materiais, tempo e espaço refere-se às questões da ludicidade, da criatividade e das expressões em artes e determina que essas linguagens sejam asseguradas às crianças e em condições adequadas.  Esta orientação consta também nas referencias aos Eixos do Currículo, no sentido de garantir a elas as experiências que favoreçam a aprendizagem e o desenvolvimento.

As creches e pré-escolas, na elaboração da proposta curricular, de acordo com suas características, identidade institucional, escolhas coletivas e particularidades pedagógicas, estabelecerão modos de integração dessas experiências. (DCNEI, 2010, p. 27. Grifos no original).

No que diz respeito às Artes, sua valorização e importância para o ensino, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 anos (DCNEF), traçam seus princípios norteadores e asseguram que estes devem primar pelo

cultivo da sensibilidade juntamente com o da racionalidade; de enriquecimento das formas de expressão e do exercício da criatividade; de valorização das diferentes manifestações culturais, especialmente as da cultura brasileira; de construção de identidades plurais e solidárias. (DCNEF, 2010, p. 06).

E todas as linguagens em Arte devem ser oportunizadas ao aluno. “A Música constitui conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular Arte, o qual compreende, também, as artes visuais, o teatro e a dança” (DCNEF, 2010, p. 14).

A escola é um espaço de aprendizado do culturalmente e cientificamente produzido, mas ela deve também representar ao aluno um lugar em que possa criar e recriar, e as Artes podem e devem proporcionar esta oportunidade a ele.

As Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental chamam a atenção para a necessidade da abordagem lúdica na discussão dos componentes curriculares. Enfatiza que “tanto o prazer como a fantasia e o desejo estão imbricados em tudo o que fazemos” (DCNEF, 2010, p. 16), logo, a área cognitiva está intrinsecamente ligada a área emocional e afetiva.

O prazer no processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança e do jovem deve estar voltado, não para o prazer hedonista, da satisfação pessoal, mas para “o prazer que decorre de uma descoberta, de uma experiência estética, da comunhão de idéias, da solução de um problema [...]” (id. ibid. Grifo nosso).

Entre o que se apregoa nestes documentos mencionados e o Projeto Político do Curso de Pedagogia, sobre a formação do pedagogo, observa-se que há uma harmonia que sugere o caminho para o fazer pedagógico.

O campo de atuação do pedagogo, segundo o Projeto Político do Curso, se traduz na concepção ampliada de docência, como ação educativa construída nas relações sociais e a concretização dos procedimentos teórico-metodológicos em sala de aula.

O curso de Pedagogia, portanto, baseado na concepção ampliada de docência, objetiva formar o licenciado em pedagogia a partir do objeto próprio de estudo da Pedagogia, fundamentada na docência que compreende o ensino, a gestão e a produção e difusão do conhecimento, nos espaços escolares e não-escolares. (PPC, 2007, p. 21).

O Núcleo de Estudos Básicos é composto por três dimensões que se articulam. São elas:

    Dimensão da reflexão sobre a sociedade, a educação, a formação humana e a escola;

    Dimensão da formação didático-pedagógica para a docência na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;

    Dimensão da organização e gestão do trabalho pedagógico na educação escolar e não-escolar. (Id. p. 25-6).

Na composição do ementário do Projeto Político do Curso de Pedagogia há somente duas disciplinas voltadas para a formação artística. Uma delas é a disciplina de Arte e Educação que está presente no projeto pedagógico no Núcleo Dimensão da Reflexão sobre a Sociedade, Educação, Formação Humana e a Escola; e a outra disciplina Fundamentos e Metodologia do Ensino de Arte e do Movimento, está presente no Núcleo Dimensão da Formação Didático-pedagógica para a Docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Nas referidas ementas, em especial na disciplina de Arte e Educação, as quatro linguagens estão contempladas, ou seja, dança, teatro, música e artes visuais, porém não de forma integral. Contatou-se um equívoco na apresentação da proposta que inclui, ou faz referência a “cinema e artes plásticas” em lugar de descrever “artes visuais”. Se considerarmos que estas matizes - “cinema e artes plásticas” – estão contempladas dentro das artes visuais, logo as demais nuances das artes visuais ficam subsumidas. Neste sentido, observa-se que há a necessidade de uma revisão da ementa na proposta da disciplina de Arte e Educação, para que as diversas linguagens sejam contempladas em sua integridade.

Por outro lado, observa-se a orientação para com o estudo da produção artística regional, atendendo assim, o que preconizam os documentos oficiais quando trata da necessidade de considerar, conhecer e vivenciar a arte regional.

Na observação à ementa da disciplina de Fundamentos e Metodologia do Ensino de Arte e do Movimento o que predomina é uma ênfase maior aos fundamentos em artes e um quase esquecimento da aplicação das metodologias nesta área do conhecimento. Desta forma, questiona-se se essa constatação na escrita se repete no desenvolvimento da disciplina quando da formação do acadêmico.

Neste sentido, na perspectiva de formar o professor ironista, além da proposta curricular do curso de Pedagogia dever estar em consonância ao que determina a legislação educacional, é fundamental que o professor compreenda e considere a importância da percepção e da sensibilidade para a formação do pedagogo por meio da experiência estética.

O DESAFIO DA ARTE COMO EXPERIÊNCIA ESTÉTICA

No campo da educação, em especial no espaço das Artes, espera-se que o professor perceba, descubra suas deficiências e limitações e busque superá-las. Ao professor cabe afinar os olhos sobre si mesmo, sobre seu ambiente de trabalho, a fim de libertar-se de ‘fotos fixas, imagens pré-fabricadas ou juízos estereotipados’. Dizendo desta forma, ao citar Imanol Aguirre, os autores Coutinho, Schlunzen Junior e Schlunzen (2011, p. 10), desejam chamar a atenção a respeito da atitude do professor em seu fazer pedagógico.

Afinar nossos olhares sobre os jovens, a fim de libertá-los de fotos fixas, imagens pré-fabricadas ou juízos estereotipados, para nos aproximar da complexidade dos imaginários desse [sic] jovens, construindo respostas mais adequadas às suas realidades. [Afinar nossos olhares], para nos aproximar e nos apropriar de nossos próprios imaginários, construindo respostas mais adequadas às nossas próprias realidades. (COUTINHO; SCHLUNZEN JUNIOR; SCHLUNZEN, 2011, p.10).

A busca da construção de outros conhecimentos e outras respostas o professor se envereda por caminhos novos que o levam para além das “narrativas fechadas”, e proporciona a descoberta de uma variedade de significados para a vida.

Além de construir respostas que consideram a realidade a qual falamos e lidamos, Almeida (2001), lembra ainda que não podemos privilegiar a cultura hegemônica:

O que podemos aprender ao longo de nossas vidas está diretamente relacionado a nosso repertório de experiências. Portanto, é preciso não privilegiar uma determinada cultura hegemônica, mas criar oportunidades para que os alunos entrem em contato com as mais variadas formas de música, dança, teatro, artes visuais [...], evitando preconceitos em relação a produções mais populares ou étnicas. (ALMEIDA, 2001, p. 16).

Considerando o conhecimento como historicamente produzido, do mesmo modo o é a sensibilidade artística e a própria cultura. As artes são expressões de identidade e cultura e, assim sendo, o papel do professor vai além de trazer esses conhecimentos aos estudantes.  

Longe de considerar o docente como aquele que sabe tudo e tem como única missão transmitir seus conhecimentos, ao vê-lo, a partir do prisma do modelo ironista, parece-nos um docente bem distinto: tramador, pesquisador, aberto à emergência e gerador de relações inéditas. Esse mesmo modelo possibilita também imaginar de outro modo as práticas educacionais e, principalmente, todo o seu propósito, não focados, exclusivamente, na aquisição de conhecimentos, senão na preparação para a vida. (AGUIRRE, 2009, p. 14).

Assim como não há uma única maneira, ou mesmo, algumas poucas e diferentes formas de práticas educacionais, também não pode haver uma unanimidade no modo de pensar em educação. Porém, na análise de Coutinho, Schlunzem Junior e Schlunzem (2013), o que há é uma ditadura de tradição de pensamentos, teorias, posturas, autores, impedindo ou cerceando que os alunos em formação construam sua própria forma de pensar.

Quando insistimos para que os processos de formação de professores, em serviço ou nos cursos de magistério e licenciatura, apresentem as condições mínimas para que se relacione teoria e prática estamos sugerindo o sentido da construção do leitor/autor da própria experiência. Experiência que se percebe a si mesma como teórica porque refletida, avaliada, recriada. (COUTINHO; SCHLUNZEN JUNIOR; SCHLUNZEN, 2013, p.23).

A proposta do pedagogo John Dewey (1859-1952), nasce de uma crítica a escola tradicional na qual o ensino estava centrado no professor e no conteúdo. Ao propor uma sociedade mais democrática, ele recorre à educação como sendo um espaço e um instrumento que possibilita às classes sociais o acesso ao saber, e para tanto, propõem uma metodologia que valoriza o indivíduo, sua experiência e seu interesse.

Segundo Barbosa (2015), ao considerar as reflexões de Larry Hickman, destaque que para este autor Dewey é um teórico da pedagogia do questionamento. Não um questionamento artificial de “plantar um problema”, semelhante as pedagogia de projetos, pois

o questionamento não é para Dewey a busca da verdade, pois ele desconfia da verdade absoluta [...], mas concebe a verdade como a busca de algum acerto garantido dentro de determinado contexto. Por esse motivo considera o questionamento essencialmente social (Barbosa, 2015, p. 19).

Imanol Aguirre (2009), nos lança uma reflexão que caminha nessa perspectiva. Amparado nas propostas de Rorty (1992), destaca que o professor não tem a prerrogativa de trazer as verdades definitivas para a formação do acadêmico.  Mas, é aquele que vai “praticar, conscientemente, a dúvida e a descrença”. O professor ironista é aquele que “duvida, radical e permanentemente, do léxico último que utiliza e adverte que um argumento formulado com seu léxico atual não pode se consolidar nem eliminar essas dúvidas”, e ainda, “utiliza a ironia como instrumento para avançar na pretensão de saber ou compreender, excluindo a idéia de ‘conhecer a verdade’”. (AGUIRRE, 2009, p. 09).

Portanto, se emito as opiniões, verdades para todos como sendo somente essas, impeço que ele pense por conta, que alcance a autonomia.

A proposta da arte colaborativa vem ao encontro de praticar essa experiência conjunta, visto que ela propõe que todos colaborem nas proposições. Nem sempre é o professor que conduz o processo, desmanchando assim a hierarquia de saber. Considerando a vivência de todos pra refletir, aprender e experimentar.

Neste cenário de formação estética o autor diz que longe está a possibilidade da sala de aula estar resumida e ser constituída de professor e aluno.

Estou consciente de que uma das primeiras ideias a serem banidas de nosso imaginário, como educadores, é a de considerar o fato educacional como uma espécie de partida que se joga a dois: o docente (adulto) por um lado, e estudantes de diversas idades (jovens), por outro. Da mesma forma, estou consciente de que não podemos permanecer na crença de que esta partida se joga apenas no terreno da escola formal.  (AGUIRRE, 2009, p. 02).

Em tempos de profundas e constantes modificações sociais e educacionais, as palavras mobilidade e aleatoriedade são, para ele, as que qualificam esse momento histórico, e é sob estas “cores” que transitam, professor e aluno, na construção de suas formações e experiências estéticas.

Alem da importância desta simbiose entre o cotidiano que envolve professor e estudante, Aguirre (2009), destaca outra preocupação: ‘a sala de aula e o quarto’. Segundo ele, estes se constituem em dois espaços que se complementam, são vitais, e assim, estão preenchidos de valores, comportamentos e ações que somados engendram a formação do estudante.

Assim se expressa Aguirre:

O quarto, normalmente, condensa todo universo emotivo, afetivo e sensível dos jovens. Nele encontramos a referências visuais [...], os motivos representativos das práticas culturais, nas quais, configuram suas experiências estéticas. [...].

Acontece que, a escola, apesar de conformar uma parte muito importante da vida cotidiana dos jovens do nosso entorno social, permanece à margem de um dos pilares fundamentais da sua formação.   A conexão entre os materiais curriculares e os repertórios estéticos juvenis é, completamente, deficitária ou nula. [...]. [Logo], [...] os estímulos visuais e musicais [...], constitui um dos desafios mais urgentes a serem enfrentados na renovação da educação artística. (AGUIRRE, 2009, p. 03. Grifos nossos).

Se se quer outras respostas às inquietações do campo educacional atual do ensino das Artes, as atitudes devem ser modificadas.

Não basta perceber a escassa presença que tem a escola na construção do imaginário, dos desejos e fantasias dos jovens que forma [...]. Faz-se imprescindível uma mudança de imaginários, relativa à distribuição disciplinar de saberes e [...], proponho que o território da educação artística seja a das praticas artísticas e dos artefatos visuais susceptíveis de gerar experiências estéticas. (AGUIRRE, 2009, p. 06)

Necessitamos um novo professor para essa sociedade da aleatoriedade, da informação e do conhecimento. Segundo Hargreaves, citado por Aguirre (2009, p. 13), “não é precisamente aquele que conhece essas informações, mas aquele que sabe o que fazer com elas e que é capaz de conseguir que seus estudantes possam processá-las e utilizá-las de maneira crítica e responsável.”

A formação que se dá no caminhar deve envolver professor e estudante.

A formação é uma viagem aberta, uma viagem que não pode estar antecipada, e uma viagem interior, uma viagem na qual alguém se deixa influenciar a si próprio, se deixa seduzir e solicitar por quem vai ao seu encontro... a experiência formativa e a experiência estética não são transitivas... não vão de alguém para alguém, mas acontecem a alguém com alguém [...]. (LARROSA, 1998, p. 64).

O olhar necessita ser outro, enxergar o fazer pedagógico de outra forma, em outras estéticas. A formação passa a envolver o todo, sendo ele momentaneamente, visível ou não, na formação do novo profissional. No entanto, ao discutir tais conceitos, informações, percepções diferenciadas, o estudante vai retirando de seu interior, de sua experiência de vida outros conhecimentos, outras vivências, não antes valorizadas.

PARA NÃO CONCLUIR...

A partir dos documentos oficiais que legislam sobre a formação do pedagogo, em especial sobre a atuação deste profissional na educação básica, fica patente o quanto se espera deste educador na contribuição para a formação da criança, no que diz respeito a sua formação estética.

Considerando que o Projeto Político do Curso de Pedagogia esteja em consonância com o que apregoam os documentos oficiais que orientam os rumos da educação, neste caso, a educação dos anos iniciais de escolarização, e após observar as limitações das ementas das disciplinas que formam o pedagogo na perspectiva da arte, pergunta-se em que medida podemos dizer que a preocupação que Aguirre traz em seus escritos – a sala de aula e o quarto – faça sentido e esteja sendo vivido e experienciado na formação universitária?

Atuar numa sociedade permeada pelos signos da aleatoriedade e da mobilidade exige do educador uma disponibilidade para duvidar, questionar e principalmente considerar que a verdade é histórica. O saber não faz sentido de você não praticar.

Acreditamos que as ações educacionais só alcançam êxito com a participação efetiva e desejada do professor, que é edificada não somente pelo processo de sua formação escolar e acadêmica, mas também e de modo importante, por seus conhecimentos construídos nas experiências vividas e perpassadas socialmente.

Nessa perspectiva, as experiências vividas falam e se revelam a cada um. São construções que se dão ao longo da vida, nas experiências do professor pesquisador, questionador e inventor de suas próprias descobertas, e em especial nas trocas realizadas no processo ensino e aprendizagem é que se revela o papel do professor. Que compreende o valor do contato e do diálogo com o estudante, sua cultura, seus saberes e seus desejos, enfim com seu quarto. Transformar o conhecimento e dar-lhes significado é o desafio dos envolvidos com o processo de formação estética do pedagogo.

Larrosa (2003), instiga a pensar intensamente no desafio da formação estética do pedagogo. Este desafio é atual, pois, levamos uma vida a qual estamos perdendo a capacidade de percepção. Percepção requer empenho. A arte tem a capacidade de fazer a pessoa parar para ver, diminuir o ritmo e perceber a mudança, o movimento.

Por fim, as reflexões que se deram para a construção deste texto, são frutos das experiências que me passaram quando me pus a ler, ouvir, relacionar, perceber, duvidar, recuar, avançar, sentir... até o momento de disponibilizar o texto ao leitor!

REFERÊNCIAS

AGUIRRE, Imanol. Imaginando um Futuro para a educação Artística. Trad. Inés Oliveira Rodrigues e Danilo de Assis Clímaco. S/L: 2009. (mimeo).

ALMEIDA, Célia Maria de Castro. Concepções e Práticas Artísticas na Escola. IN: FERREIRA, Sueli. (org.). O Ensino das Artes: construindo caminhos. Campinas/SP: Papirus, 2001, p. 11-38.

BARBOSA, Ana Mae. John Dewey e o Ensino da Arte no Brasil. 8ª Ed., São Paulo: Cortez, 2015.

BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Conselho Pleno. Resolução nº. 1, de 15 de maio de 2006, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. 

_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. 

_______. Secretaria da Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC, 2010.

_______. Secretaria da Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília: MEC, 2010.

COUTINHO, Rejane Galvão, SCHLUNZEN JUNIOR, Klaus e SCHLUNZEN, Elisa Tomoe Moriya. (Coord.). Artes. São Paulo: Cultura Acadêmica, Universidade Estadual Paulista: Núcleo de Educação a Distância. 2013. (Coleção Temas de Formação; Vol. 5).

­­­­________. Isto Também é uma Metodologia: duas versões contemporâneas de métodos, metodologias, educação e arte. Rede São Paulo de Formação Docente. Curso de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP Ensino Fundamental II e Ensino Médio São Paulo. REDEFOR/UNESP, 2011, p. 01-19.

DEWEY, John. Dewey. Trad. Murilo Otavio Rodrigues Paes Leme. São Paulo: abril Cultural, 1980. (Coleção Os Pensadores)

LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Trad. João Wanderley Geraldi. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Jan/fev/mar/abr 2002, nº 19.

_______. Pedagogia Profana: danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre. Contrabando, 1998.

_______. Tremores: escritos sobre experiência. 1ª Ed., 1ª reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. (Coleção Educação: Experiência e Sentido)
PROJETO Político do Curso de Pedagogia. Universidade Federal do Tocantins. Campus de Miracema. Miracema do Tocantins, 2007.